***
“O homem contemporâneo está exausto de ser si mesmo.”
Byung-Chul Han – A Sociedade do Cansaço
***
“Enquanto o mundo corre atrás de resultados, ela apenas balança e, sem saber, reencontra o tempo.”
***
Todos os dias, ao voltar do trabalho, costumo variar o caminho. Mas, perto de casa, há um lugar que sempre me chama a atenção. Ali, bem no meio do quarteirão, está a casa de uma senhorinha que, por incrível que pareça, não sei o nome. Simples, de madeira, pintada num tom de marrom que o sol já desbotou. As tábuas rangem com o vento, e o portão de ferro, cansado, ainda resiste firme, como quem aprendeu a ficar.
É sempre no mesmo horário: o sol se inclinando atrás das mangueiras e dos flamboyants, o som das maritacas disputando espaço com o canto rouco das araras-canindés. E lá está ela, balançando-se no velho balanço preso à viga de madeira da varanda.
Senta-se com calma, ajeita o vestido florido e, com um leve impulso dos pés, começa o vai e vem sereno, compassado, como quem aprendeu a conversar com o tempo.
Enquanto o resto do mundo corre, carros apressados, gente de olhar cansado, celulares acesos até no pôr do sol, lá está ela, simplesmente balançando. E o som do seu balanço, misturado ao das araras, tem algo de sagrado: um lembrete de que ainda é possível existir sem pressa.
Para muitos, escrever sobre uma senhora num simples balanço pode parecer banal. Mas talvez seja justamente aí que mora o essencial, aquilo que Byung-Chul Han chamaria de fuga da sociedade do cansaço.
Enquanto todos se esgotam tentando produzir mais, mostrar mais, ser mais, ela parece ter escolhido o contrário: apenas ser. No compasso do balanço, devolve sentido à pausa, faz do vento um amigo e do entardecer, uma oração.
Eu, que passo ali todos os dias, confesso: reduzo o passo só pra vê-la.
É como se aquele pedaço do mundo ainda acreditasse no tempo das coisas simples, no café coado com calma, na roupa secando ao sol, no cheiro da terra molhada depois da chuva, na tubaína com paçoquinha da venda do Seu Zé, no pão quentinho saindo do forno. Mesmo sem conhecê-la, percebo que ela não precisa de muito: tem seu balanço, suas goiabeiras, as mangueiras que sombreiam o quintal e o coro colorido das maritacas.
Enquanto isso, nós seguimos presos em nossos relógios, acelerando sem saber pra onde ir, em metas descabidas, buscando aquilo que não se mede, olhando telas que mostram o que não precisamos. Talvez, no fundo, o segredo da felicidade esteja ali, entre o barulho das araras e o rangido suave das cordas do balanço: o simples ato de deixar o tempo passar e se deixar balançar junto com ele.
Porque, no fim, é do impulso leve que nascem os voos mais altos!
Tiago Rafael dos Santos Alves
Professor da Rede Estadual de SP / FADAP/FAP – Tupã
Historiador – nº 0000486/SP
Gestor Ambiental: CREA-SP nº 5071624912
Mestre pelo PPGG-MP – FCT/UNESP
Doutorando pelo PGAD – FCE/UNESP
E-mail: tiagorsalves@gmail.com

